A Verdade e a Mentira sobre as Vacinas - Entrevista com Mário Cordeiro no Pais & Filhos

O pediatra Mário Cordeiro acaba de lançar “A Verdade e a Mentira sobre as Vacinas“. Porque a “memória é curta” e é preciso agitar consciências, esclarecer, desmistificar  e relembrar. Não nos podemos esquecer, diz, que alguns vírus “nos querem matar”.


Porquê um livro sobre Vacinas?
É uma pergunta muito pertinente. Custa quase a acreditar que, em 2017, num país como o nosso, com um Programa Nacional que já tem 52 anos e tantas centenas de milhares de mortes evitadas e tantos milhões de internamentos e sofrimento prevenidos, se tenha de voltar ao tema... talvez por isso, porque a memória é curta, porque muita gente acha que este conforto e ausência de certas doenças é obra do acaso e não fruto de um trabalho continuado, e porque não entendem que se essas doenças desapareceram é, precisamente, porque os pais portugueses têm sido altamente responsáveis e têm vacinado os filhos! O livro pretende desmistificar ideias feitas, teorias da conspiração, mentiras científicas, e ao mesmo tempo contar a história das vacinas, o futuro que elas podem tomar e responder às "mil e uma" dúvidas que qualquer pai ou mãe terão.


O que é que os pais precisam de saber?
Que as doenças matam e as vacinas salvam. Que as vacinas são altamente testadas, que são seguras, eficazes e que são uma coisa boa - aliás, foi esta noção que levou os nossos pais a vacinar e Portugal atingir níveis fantásticos de vacinação, no top-ten do mundo, sem haver obrigatoriedade. Precisam de saber que as doenças não desapareceram (excepto a varíola) e que apenas estão controladas e à espreita de que "a muralha abra brechas"... algumas bactérias e alguns vírus querem-nos mal. Querem-nos matar. Se formos nós a abrir essas brechas, acho que srá um "tiro no pé" civilizacional.


Porquê tantas dúvidas em relação a este assunto?
É próprio de uma sociedade rica, afluente, que por muito que se queixe não repara que está entre os países mais avançados e civilizados. Obrivemos ganhos incalculáveis. Para os que dizem mal das vacinas, seja, porque elas "mexem com a imunidade" (ainda bem... é o que se pretende), seja porque inventam complots das multinacionais com os governos e com os microorganismos, em teorias que roçam o ridículo, ou que dizem mentiras, como as vacinas causarem o cancro (pelo contrário, no caso do HPV até previnem mais de 85% dos cancros do colo do útero!), eu recomendava uma ida a África e uma visita aos serviços de pediatria onde se vê crianças a morrerem de sarampo,  difteria, de tantas meningites bacterianas, tuberculose ou tosse convulsa. Estou saturado desta arrogância, jactância e soberba de pessoas novo-ricas que acham que "estão acima das vacinas" - desenganem-se. Não estão!


Não vacinar é uma moda?
Felizmente ainda não e espero que não venha a ser. Mas por haver um crescendo dos movimentos antivacina, é bom que quem defende a maior conquista de Saúde Pública de sempre seja igualmente veemente, interventivo e não se deixe ficar num marasmo. Foi por isso que escrevi o livro, para agitar consciências, esclarecer e relembrar que os microorganismos estavam cá antes do ser humano e querem ficar depois de nós.

"Para os pais que têm de as pagar - meningite B, varicela, rotavírus... - advogo que, até aos limites do possível, façam esse esforço e pensem em como ir buscar esse dinheiro a outros items."

Quais os desafios do PNV português nesta fase?
Continuar a cativar as pessoas para a vacinação (crianças, mas também adultos!) explicando que se realmente as doenças foram controladas é porque se vacinou. Qualquer atitude menos forte levará a que apareçam surtos, como foi o caso do surto de sarampo de 2017. Depois, que é uma obrigação moral vacinar os filhos, mesmo sem obrigatoriedade (que, aliás, não defendo) e que a própria defesa dos que, por qualquer razão médica, não se podem vacinar, é um dever cívico. Depois, evitar oportunidades perdidas de vacinar, evitar enviar crianças para trás por motivos errados, desfazer mitos de falsas contraindicações e de efeitos secundários que são leves e passageiros, desfazer a ideia que as vacinas causam autismo, cancro ou outra coisa qualquer, e tentar evoluir - como tem feito - para mais vacinas (integrando as que ainda não fazem parte do Programa), associar vacinas para evitar tantas "picadas" (já existe uma hexavalente!!) e, no fundo, agilizar e facilitar o processo, mas, citando o professor Arnaldo Sampaio, o que é necessário é "vacinar, vacinar e vacinar", ou, repito: o que mata são as doenças. As vacinas salvam. E que cada pai ou mãe que não vacina os filhos sem razão médica, que pense se conseguirá dormir descansado se o filho morrer com uma meningite, uma difteria ou um sarampo...


As vacinas deveriam ser obrigatórias?
Não creio. Portugal conseguiu taxas elevadíssimas sem ser necessária essa imposição. Importa continuar a defender o bom nome das vacinas e a lutar por elas, com a mesma ou maior força do que os movimentos antivacinas. Ser obrigatório implicava uma averiguação da responsabilidade dos que não cumprissem sanções, enfim, um conjunto de coisas que eram inexequíveis. Seria uma lei que não serviria para nada. A nossa obrigação de vacinar não deve ser legal, deve ser moral, social, civilizacional.

 


Uma criança não vacinada deveria ser autorizada a frequentar a escola?

Há uma lei (algo incongruente), já dos anos 60 do século passado, que diz que uma criança sem a vacina do tétano não pode frequentar a escola. Sendo a escola obrigatória e as vacinas não, há algo aqui de estranho. Por outro lado, a vacina do tétano é, justamente, uma das poucas que não confere imunidade de grupo, ou seja, o tétano só lesa o próprio. Além disso, a escola obrigatória só começa aos seus 6 anos ( vá lá, aos 3…), e as vacinas devem estar feitas muito antes disso!

 

Há vacinas fora do programa e que são caras. Como fazer?
É um problema. Incluir as vacinas no PNV dependem de uma decisão técnicas, mas também de uma decisão político-financeira, dado que têm de constar do OGE. Espero que, ano após ano, mais vacinas venham a fazer parte do PNV, como foi há uns anos a anti-pneumocócica, aliviando o esforço das famílias.

 

Para os pais que têm de as pagar - meningite B, varicela, rotavírus... - advogo que, até aos limites do possível, façam esse esforço e pensem em como ir buscar esse dinheiro a outros items. Dou exemplos de coisas que não servem para nada: esterilizadores de biberões, intercomunicadores, roupas e mais roupas que deixam de servir, brinquedos quando os pais são os melhores brinquedos dos filhos, colheres XPTO para dar a papa... e também que avós, padrinhos, tios e demais, ofereçam vacinas aos bebés, em vez de tralha que não serve para nada, nunca é usada e acaba por empanturrar as casas já de si pequenas. Ofereçam vacinas. Deem um presente para a vida. As vacinas salvam, as doenças matam! Nunca se esqueçam disso!

Publicado em 28 Dezembro 2017

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