Últimos Ritos - Crítica em As Leituras do Corvo



Condenada à morte pelo homicídio de dois homens, Agnes Magnúsdóttir é enviada para viver com a família do xerife de Kornsá na sua quinta enquanto aguarda o momento da execução. Aparentemente, a solução não agrada a ninguém, mas, por mais que a família escolhida proteste contra a imposição, na verdade não têm escolha. Quando Agnes chega, estão todos mais que dispostos a tratá-la como a criminosa que, ao que tudo indica, é. Todos, menos o inexperiente reverendo a quem é atribuída a orientação espiritual da condenada. Será Tóti o primeiro a interessar-se pela verdade que Agnes tem para contar. Mas será que ouvi-la é suficiente para mudar alguma coisa?

História de os últimos dias de uma condenada à morte, esta não é - nunca poderia ser - uma leitura leve nem fácil. E por várias razões. A primeira é, desde logo, a tensão quase palpável em torno das circunstâncias da protagonista. Na iminência da morte, ante o desprezo ou o ódio de muitos, Agnes é uma mulher só como nenhuma outra, e isso apenas se torna mais visível pelo facto de tudo acontecer num cenário bastante inóspito. Além disso, ao alternar a narrativa entre a terceira pessoa e a voz da própria Agnes, a autora consegue criar uma aproximação gradual à sua personagem, o que só torna mais presente o horror das suas circunstâncias.

Para este cenário tenso, sombrio, irremediavelmente negro, a autora toma uma voz que se adequa na perfeição. Sem elaborações desnecessárias, narrando as conversas e os factos como são, e criando depois um brilhante contraste entre a crueza dos factos e a quase poesia dos momentos mais introspectivos, há uma estranha harmonia na forma como as palavras moldam a história. Também isto reforça o impacto dos acontecimentos e do tempo passado à espera da derradeira acção.

Também particularmente impressionante numa história que é, no fundo, uma caminhada para a morte, é o percurso de mudança das personagens. Da própria Agnes, é certo, à medida que o que verdadeiramente aconteceu vai ganhando vida pela sua própria voz, mas acima de tudo daqueles que a acolheram na fase final da sua vida. A passagem do desdém e do desconforto a uma empatia que, com o fluir das revelações, se torna mais forte, mostra que nem todos os monstros são assim tão monstruosos e que o medo pode dar lugar à aceitação.

E, por fim, Agnes. Não a assassina ou a criatura monstruosa que muitos vêem, mas uma mulher complexa, forte perante circunstâncias desesperadas. Primeiro pelo isolamento e depois pela história gradualmente revelada, Agnes é uma figura que não só desperta empatia, mas também fascínio pela sua história sem respostas fáceis nem verdades redentoras. Se é certo que tudo é bom neste livro, Agnes é, ainda assim, a verdadeira alma da história.

Tudo isto converge num livro com tanto de perturbador como de fascinante. Uma história com personagens marcantes num cenário sombrio, em que a percepção da morte é uma sombra sempre presente, mas onde, ainda assim, há muita vida. Intenso, marcante e surpreendente, um livro impressionante.

Publicado em 18 Março 2015

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